A Justiça Eleitoral de Ijuí acatou o pedido do Ministério Público, referente a uma Ação de Investigação eleitoral, envolvendo o Vereador Jorge Amaral de Oliveira, Progressistas, de Ijuí.
A decisão da justiça determina a cassação do diploma do vereador, por ter sido beneficiado pela prática de abuso de poder público e por utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social.
Também foi declarada a inelegibilidade de Jorge Amaral, por 8 anos, a contar da eleição, pela prática por abuso de poder político e por utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, conforme prevê a legislação.
Com a decisão, foi declarada ainda a nulidade dos votos obtidos pelo vereador, inclusive para a legenda, de acordo com o código eleitoral, com a determinação do recálculo do quociente eleitoral e partidário e a retotalização dos votos. Cabe recurso.
O vereador Jorge Amaral afirmou no entanto, que vai recorrer, pois seu mandato segue normal, até que ocorra uma decisão transitada em julgada.
Em nota à imprensa, sua defesa esclarece o seguinte:
A defesa técnica do vereador Jorge Gilmar Amaral de Oliveira, através da Zinn escritório de advocacia, vem a público manifestar sobre a decisão singular da 023 Zona Eleitoral de Ijuí, que determinou a cassação de seu diploma a declaração da inelegibilidade e a anulação dos votos por ele obtidos nas eleições municipais de 2024.
A decisão tem como fundamento alegações de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação social. Entretanto, a defesa ressalta que não houve intenção de desinformar ou atacar qualquer adversária política, mas sim o exercício do direito da liberdade de expressão e manifestação dentro do contexto das eleições municipais.
Desde o início do processo, a defesa sustentou que a publicação em questão não foi impulsionada ou patrocinada, foi postada em perfil pessoal e permaneceu ativa por algumas horas, sendo removida espontaneamente pelo próprio vereador.
Além disso, o vídeo utilizado já era público e de livre acesso, sem qualquer edição ou modificação do seu conteúdo original.
A defesa reitera que recorrerá da decisão junto ao Tribunal Regional Eleitoral, TRE/ RS, confiando que as instâncias superiores reconhecerão a fragilidade da acusação e reverterão a sentença.
Por fim, Jorge Amaral reafirma seu compromisso com a população de Ijui, rejeita qualquer acusação de violencia política de gênero e seguirá atuando dentro da legalidade e da ética política para defender seus direitos e a vontade de seus eleitores.
Confira a íntegra da denúncia e a decisão da Justiça Eleitoral:
Brasão da República
JUSTIÇA ELEITORAL
023ª ZONA ELEITORAL DE IJUÍ RS
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0600813-75.2024.6.21.0023 / 023ª ZONA ELEITORAL DE IJUÍ RS
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
INVESTIGADO: JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA
Advogados do(a) INVESTIGADO: ROBSON LUIS ZINN – RS53371, DOUGLAS BISOGNIN DE FREITAS – RS108217, WILLIAM SCHMIDT BAGGIO – RS133270
SENTENÇA
O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL ajuizou AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE), pela prática de abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação, em face de JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA, alegando que entre os dias 29 de setembro e 06 de outubro de 2024, o investigado JORGE, candidato a reeleição ao cargo de vereador, através de postagem de vídeo em seus perfis nas redes sociais e visando a fins de propaganda, praticou abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação mediante desinformação, falsidade e inverdade contra candidata adversária nas eleições municipais. Na oportunidade, o investigado, utilizando-se de menosprezo e discriminação, com a finalidade de dificultar a campanha eleitoral e causar grave ofensa à honra da candidata adversária, veiculou vídeo em suas redes sociais contendo grave desinformação e descontextualização, que atingiu a dignidade, o decoro e a honorabilidade da candidata ao cargo de vereadora DÉBORA VIEIRA DE OLIVEIRA, conforme os vídeos e demais informações juntados. Na ocasião, JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA produziu, montou e divulgou um vídeo em que aparece falando: “Pessoal, eleitor, estamos na reta final das eleições. E vou te apresentar os candidatos do PT (…)”. A seguir, depois de tecer críticas aos candidatos a Prefeito e Vice-Prefeito da referida legenda partidária, o investigado passa a referir-se à candidata Débora, com destacada ênfase, com palavras, gestos e expressões corporais de deboche, menosprezo e discriminação, da seguinte forma: “Bah, e dos vereadores do PT, a melhor. Sensacional. Mete aí um pouquinho da campanha da parceria do PT”. Ato contínuo, segue a exibição da montagem de vídeo feita pelo denunciado, mostrando trecho de uma publicidade audiovisual protagonizada e postada por Débora muito antes do período da propaganda eleitoral e, sobretudo, absolutamente fora do contexto de uma campanha eleitoral, tendo em vista que a publicação realizada pela candidata ofendida tinha o escopo de divulgar festa temática direcionada ao público jovem. Ao final da exibição do vídeo, sempre se utilizando de deboche, menosprezo e discriminação a Débora, o investigado Jorge Amaral, fazendo gestos obscenos e com inegável referência à pessoa da então candidata, repetiu por três vezes “puta, puta, puta”, expressão contida na peça de publicidade da qual o investigado se utilizou para fazer a montagem e divulgação ofensivas. Sustentou que o conteúdo abjeto e infamante do vídeo – pensado, produzido, montado e protagonizado pelo investigado – foi publicado nas redes sociais de JORGE AMARAL (incluindo Facebook e Instagram), que contam milhares de seguidores, destacando-se que o investigado é pessoa que exerce grande liderança na comunidade regional, já tendo sido candidato a deputado estadual, sendo médico conhecido na comunidade, comprometendo a legitimidade e a normalidade do pleito. Requereu a procedência, para determinar a cassação do diploma do investigado JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA, por ter sido beneficiado pela prática de abuso de poder político e por utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da Lei Complementar Federal nº 64/90, c/c o artigo 14, § 9º, da Constituição Federal de 1988; declarar a inelegibilidade do investigado JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA pelo prazo de oito anos a contar da eleição, pela prática de abuso de poder político e por utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da Lei Complementar Federal nº 64/90, c/c o artigo 14, § 9º, da Constituição Federal de 1988, bem como por violação ao artigo 6º, §4º, da Res. TSE 23.735/2024 6; e a anulação dos votos obtidos pelo candidato, inclusive para a legenda, na forma do art. 222 do Código Eleitoral, com a determinação do recálculo do quociente eleitoral e partidário e a retotalização dos votos.
Recebida a AIJE, o réu contestou (126882180), alegando preliminarmente a intempestividade da presente ação, pois ajuizada após a diplomação dos eleitos, requerendo a pronta extinção. No mérito, disse que não houve qualquer intenção de ferir a imagem da candidata adversária, mas tão somente exercer o direito de manifestação sobre assuntos públicos e políticos, especialmente considerando que a própria candidata adversária DÉBORA VIEIRA DE OLIVEIRA havia veiculado o vídeo em suas redes sociais, sem qualquer restrição de acesso, configurando- se como conteúdo público, já que a mesma inclusive estava na condição de candidata à vereança. Além disso, o vídeo não possui qualquer conteúdo que possa ser objetivamente considerado ofensivo, já que não se tem manifestação do demandado, apenas a reprodução do vídeo da candidata, o qual inclusive continua publicado. Referiu que as críticas severas, ainda que contundentes, são permitidas no contexto eleitoral e até mesmo normal dado o contexto de polarização política no Brasil e no mundo. Por fim, referiu que o vídeo compartilhado pelo investigado não foi impulsionado nem patrocinado. Foi publicado em seu perfil pessoal no Facebook apenas em sua rede de amigos na rede social, sendo que ficou ativo apenas por 3 horas e logo em seguida o investigado excluiu a publicação. Sustentando que não há que se falar em abuso de poder político ou uso indevido dos meios de comunicação social, requereu a improcedência da ação.
Houve réplica, insurgindo-se o MPE à preliminar suscitada 126840640.
Designada instrução conjunta com o processo criminal (126882180), o MPE requereu que fosse realizada separadamente (126921897), o que foi acolhido (126927272).
O feito foi instruído com a oitiva das testemunhas arroladas (126938296), requerendo o MPE a juntada dos atestados médicos da testemunha Débora, por ela mencionados, o que foi indeferido, pois a busca de atendimento médico em razão do ocorrido já havia sido por ela relatado no depoimento juntado na inicial.
Tendo havido problema no áudio da gravação do depoimento de uma testemunha, foi realizada a reinquirição (126979023), a pedido do MPE (126946686). Ao final, foram as partes intimadas para alegações finais.
O MPE reiterou o pedido de procedência, com a cassação do diploma (e mandato) do Requerido JORGE, a declaração de inelegibilidade do Requerido JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA pelo prazo de oito anos a contar da eleição pela prática de abuso de poder político e por utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, e a anulação dos votos obtidos pelo candidato, inclusive para a legenda, na forma do art. 222 do Código Eleitoral, com a determinação do recálculo do quociente eleitoral e partidário e a retotalização dos votos.
O representado, por sua vez, reiterou a alegação de intempestividade da ação, e no mérito, requereu a improcedência, insurgindo-se inicialmente à oitiva da vítima, e alegando que prova testemunhal produzida é insuficiente para um juízo condenatório, pois comprovado que o vídeo utilizado pelo investigado já era público e que não houve alteração do seu teor, nem de eventual interferência em sua candidatura (de Débora). Discorreu acerca da liberdade de opinião e manifestação, alegando que não houve qualquer intenção de ferir a imagem da candidata adversária, mas tão somente exercer o direito de manifestação sobre assuntos públicos e políticos, tratando-se de vídeo por ela mesma divulgado em suas redes sociais, em perfil indicado à Justiça Eleitoral, de maneira pública e com livre acesso a qualquer pessoa, e que continua disponível. Reiterou o pedido de improcedência.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É O RELATÓRIO.
PASSO A DECIDIR.
Primeiramente, afasto a preliminar de intempestividade levantada pelo investigado, pois conforme atual orientação do TSE, o prazo final para ajuizamento da AIJE é a data final da diplomação fixada pelo TSE no calendário eleitoral, sendo irrelevante o dia em que de fato ocorreu a solenidade de diplomação do representado.
Não mais preval_ece o entendimento de que o prazo final para propositura da AIJE é o dia da sessão em que realizada a diplomação, mas sim a data final prevista na legislação, que é 19/12, sendo tempestiva a ação. Afasto, portanto, a preliminar de decadência.
Também não há irregularidade na oitiva de Débora, arrolada como testemunha, pois embora tenha sido “vítima” da propaganda negativa, a imputação é de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, que não possui vítima específica.
Procede a ação, não obstante o alegado pela defesa.
Restou comprovada a prática de abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação mediante desinformação pelo réu, contra candidata adversária nas eleições municipais de 2024.
Conforme glossário eleitoral brasileiro, disponível no Portal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na internet, “O abuso do poder político ocorre nas situações em que o detentor do poder se vale de sua posição para agir de modo a influenciar o eleitor. Caracteriza-se, dessa forma, como ato de autoridade exercido em detrimento do voto”, que pode afetar a legitimidade de uma eleição.
Prevê o art. 22 da LC 64/90:
Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político (…)
A resolução 23.735/ 24 do TSE também dispõe acerca do abuso de poder, fraude e corrupção, prevendo o art. 6º:
DO ABUSO DE PODER, DA FRAUDE E DA CORRUPÇÃO
Art. 6º A apuração de abuso de poder em ações eleitorais exige a indicação de modalidade prevista em lei, sendo vedada a definição jurisprudencial de outras categorias ilícitas autônomas.
§ 1º O abuso do poder político evidenciado em ato que tenha expressão econômica pode ser examinado também como abuso do poder econômico.
§ 2º A fraude à lei pode ser examinada como abuso de poder, desde que subsumida a uma das modalidades do ilícito previstas no sistema.
§ 3º O uso de aplicações digitais de mensagens instantâneas visando promover disparos em massa, com desinformação, falsidade, inverdade ou montagem, em prejuízo de adversária(o) ou em benefício de candidata(o) configura abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social (Tribunal Superior Eleitoral, AIJEs nº 0601968-80 e nº 0601771-28, julgadas em 28/10/2021).
§ 4º A utilização da internet, inclusive serviços de mensageria, para difundir informações falsas ou descontextualizadas em prejuízo de adversária(o) ou em benefício de candidata(o), ou a respeito do sistema eletrônico de votação e da Justiça Eleitoral, pode configurar uso indevido dos meios de comunicação e, pelas circunstâncias do caso, também abuso dos poderes político e econômico.
Importante destacar, ainda, a Lei n. 14.192/2021, que visa a acautelar, reprimir e combater a violência política contra a mulher para criminalizar essa prática e sustentar a participação de mulheres em debates eleitorais, proporcionalmente ao número de candidatas às eleições, alterando ainda o Código Eleitoral e a Lei dos Partidos Políticos), para incluir ou modificar dispositivos que pudessem ocasionar choques interpretativos.
A compreensão do preconceito e do machismo histórico, perpetrados pela discriminação e violência, durante as eleições brasileiras e na constância do mandato feminino, não é de hoje, e acabou dando ensejo à referida lei como mecanismo para prevenir, inibir e enfrentar essas atitudes que prejudicam a formação de lideranças femininas e impossibilitam a plenitude do funcionamento do exercício do Estado democrático de direito.
Assim consta na referida legislação:
Art. 1º Esta Lei estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, nos espaços e atividades relacionados ao exercício de seus direitos políticos e de suas funções públicas, e para assegurar a participação de mulheres em debates
eleitorais e dispõe sobre os crimes de divulgação de fato ou vídeo com conteúdo inverídico no período de campanha eleitoral.
Art. 2º Serão garantidos os direitos de participação política da mulher, vedadas a discriminação e a desigualdade de tratamento em virtude de sexo ou de raça no acesso às instâncias de representação política e no exercício de funções públicas.
Parágrafo único. As autoridades competentes priorizarão o imediato exercício do direito violado, conferindo especial importância às declarações da vítima e aos elementos indiciários.
Art. 3º Considera-se violência política contra a mulher toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher.
Parágrafo único. Constituem igualmente atos de violência política contra a mulher qualquer distinção, exclusão ou restrição no reconhecimento, gozo ou exercício de seus direitos e de suas liberdades políticas fundamentais, em virtude do sexo.
Quanto à alteração do Código Eleitoral, a referida lei deu nova redação ao art. 243 daquele, assim dispondo:
Art. 243. Não será tolerada propaganda:
(…) X – que deprecie a condição de mulher ou estimule sua discriminação em razão do sexo feminino, ou em relação à sua cor, raça ou etnia.
Passo a analisar a conduta do réu.
O investigado divulgou o vídeo de campanha eleitoral de Débora, em que o candidato a Prefeito do PT refere que “ela está preparada para estar na câmara” (126738105), realizando uma montagem com o vídeo de publicidade que ela havia realizado e postado em seu Instagram em 13 de abril de 2024 (126738107), em que aparecia com roupas sensuais.
Aliás, o próprio investigado, em seu depoimento policial sobre o caso (126738110), admite ter feito a referida montagem (“…Eu fiz uma montagem do vídeo dela e quis mostrar pra população, dentro dos meus conceitos de família: olha, a candidata a vereadora é essa aí”). Referiu que estava em campanha eleitoral, sendo o declarante de direita, e que vinha fazendo alguns vídeos mostrando comportamento de candidatos do PT às eleições de Ijuí, de algumas mentiras que estavam sendo divulgadas por eles. A candidata Débora chamou o declarando de “burro” ou algo parecido nas redes sociais, e o candidato (a prefeito) dela disse que ela estava “preparada para ser vereadora”. Foi então nas redes sociais dela e pegou um vídeo dela, que ela havia publicado, que ela estava seminua, que está até hoje disponível, e publicou o vídeo dizendo “olha o preparo da candidata”, no qual havia a música que dizia “puta, puta, puta”. Fez a montagem e quis mostrar para a população, dentro de seus conceitos de família, “olha a candidata a vereadora, é essa aí”. Derrubou o vídeo logo depois, pois deu bastante visualização, “achou que ia dar merda”. Arrependeu-se de ter feito o vídeo, que acabou sendo um pouco pesado demais, pois a vida pessoal dela não lhe interessa.
Em contestação no presente feito, o réu confirma ter veiculado o vídeo de Débora logo em seguida à sua apresentação pelo candidato a prefeito, dizendo entretanto que não havia intenção de ofender, e que não modificou a mídia.
No entanto, não há como acolher-se tal alegação, estando evidente a intenção difamatória, tendo ele próprio alegado na DP que “quis mostrar para a população, dentro de seus conceitos de família”, “olha a candidata a vereadora, é essa aí”. Tal ocorreu logo após ter sido chamado de “burro ou algo parecido” por Débora numa propaganda, e então resolveu fazer uma busca em seu Instagram, tendo então encontrado o vídeo, que usou para fazer a montagem.
A testemunha DÉBORA VIEIRA DE OLIVEIRA, questionada acerca do vídeo que deu ensejo à presente ação, disse que gravou o vídeo original (126738107 juntado com a inicial), e viu o vídeo postado pelo Jorge Amaral (126738105 com a inicial), “são 2 vídeos”. “Ele começa o vídeo com o vídeo da minha campanha”, em que o que candidato Beto Noronha fala que eu estava preparada para estar na Câmara de vereadores, aí ele cortou esse vídeo (que tem 2 minutos e pouco), que é sobre a campanha, sobre propostas, e iniciou um vídeo dela, que foi postado em abril, que era uma campanha publicitária para uma festa da Astral Produções, para o público LGBTQIA+, com o tema “Caliente”, era uma festa à fantasia. Tem uma parceria com o salão de beleza onde foi gravado o vídeo com a roupa, maquiagem, o cabelo com a temática para festa. Ficou sabendo do vídeo do Jorge no dia que ele foi postado, recebeu uma ligação informando do vídeo. Não assistiu o vídeo no dia de sua postagem, pois ficou nervosa, e muito mal porque começou a receber questionamentos de algumas pessoas achando que ela mesma tinha mandado o vídeo ao Jorge. Algumas pessoas de mais idade entenderam também que o vídeo tinha sido postado durante a campanha, porque ele falava “bota ai um pouco da campanha”.
Daí se evidencia que de fato o vídeo gerou desinformação ao ser descontextualizado, dando a entender que se tratava de um vídeo de campanha eleitoral (tanto que exibido logo após vídeo de campanha em que ela era apresentada como candidata a vereadora, e que estava qualificada para tanto), e gerando questionamento do público em geral acerca da conduta de Débora.
Nesse sentido, veja-se o relato de Régis, arrolado pela defesa, ao referir que “ficou chocado com a postura de Débora, de postar um vídeo indevido na campanha, achando que o melhor seria retirar o vídeo do ar antes de se candidatar. Entendeu que não era a postura de alguém que estivesse fazendo campanha.”
Seguiu DÉBORA dizendo que a partir da publicação do vídeo, sua campanha acabou, pois conseguir reverter isso era muito difícil. No outro dia se manifestou explicando que era um vídeo tirado de contexto. Era a primeira vez de sua candidatura, Jorge já era vereador. O vídeo foi postado na última semana de campanha. Jorge chamou Débora na segunda-feira seguinte (após a campanha), mas não respondeu. E nem falou com ele após. Sua campanha era para um público mais jovem, com 7 propostas, houve compartilhamento de sua campanha. Desenvolveu crises de pânico após a divulgação do vídeo por Jorge, sendo a primeira vez um dia após a divulgação do vídeo. O vídeo postado por Jorge continua sendo assunto. Assistiu o vídeo junto com o comitê de campanha. Conhece Jorge porque ele é Vereador e Médico na cidade, e acredita que ele prejudicou 100% de sua campanha. Estimou que faria em torno de um 600 e 700 votos, mas “em cima da hora” recebeu mensagens de pessoas falando que haviam trocado o voto. Fez em torno de 322 votos. É filiada ao partido desde 2020, envolvendo-se nas questões políticas, tendo realizado campanha para o Lula. Disse que Jorge vincula sua campanha para o lado Bolsonarista, pátria, família. Não tem certeza, mas acha que o vídeo ficou umas 3 ou 4 horas online. Acreditava que tinha chances de ser eleita, isso antes do vídeo de Jorge. Mostrado o vídeo a depoente, disse que a música usada no vídeo é da Anitta, não tendo sido modificada por Jorge, mas era um vídeo de uma campanha junto ao salão de beleza, postada no Instagram. Disse que Jorge pegou um vídeo de campanha, no início falou “bota aí um pouco da campanha do PT”, dando a entender que isso era um vídeo de campanha, o que fez com o objetivo de lhe atacar por ser jovem, mulher. O vídeo era completo, começa falando de várias pessoas do partido, depois o vídeo de Débora na campanha, e termina com o vídeo descontextualizado, da campanha publicitária, tendo sido feita uma montagem por Jorge. O corte colocado no vídeo de Jorge é um vídeo real, mas ele manipulou a intenção, dando a entender que era tudo campanha eleitoral. Não foi feita pesquisa eleitoral sobre o número de votos, estava falando apenas de sua percepção.
Inquestionável que o vídeo de Débora era publicitário, para promoção de uma festa temática, tendo sido veiculado pelo salão de beleza que a havia produzido. Disse KERUAK JORIEL GOI DA FONSECA, dono do salão, que o vídeo foi vinculado a uma parceria com a festa Astral, tendo o declarante arrumado o cabelo e maquiagem dela (de Débora). O vídeo foi feito no dia 13//04/2024, quando Débora ainda não era candidata. Como se trata de parceria, o vídeo ainda está nas redes. Estava mexendo no celular quando viu o vídeo de Jorge, e automaticamente mandou a ela perguntando o que estava havendo. Acredita que o vídeo ficou cerca de 24h postado, e ele continuou nas redes mesmo após ser deletado do Instagram. Acha que a campanha de Débora se manteve após o incidente, mas não atingiu o número de expectativa por conta do vídeo. Soube que no dia seguinte à postagem do vídeo, Débora foi ao hospital, pois ela postou algo. Conhece Jorge por ser falado como médico. A música do vídeo de Débora usado por Jorge era a original, não foi alterada, mas o vídeo não tinha nada a ver com a campanha.
A circulação do vídeo continuou após a exclusão pelo representado. ÉDIO RUI NEHRING, ouvido como informante, disse que soube do vídeo divulgado por Jorge. Recebeu de amigos e adversário políticos em tom pejorativo. Disse ser uma montagem, de dois vídeos que foram juntados, um de uma campanha publicitária e o outro da campanha política. A campanha de Débora “deu uma caída”, pois Débora ficou abatida e se afastou. Escolheu a Débora para apoiar porque gostava das propostas políticas dela. Acredita que se não fosse a difamação feita pelo outro partido, ela teria sido eleita. Conhece Jorge Amaral pois eram vizinhos, disse que ele é muito conhecido na comunidade, tendo muita influência. Informou que é filiado ao PT desde meados dos anos 80. Atualmente segue as redes sociais de Débora, antes não seguia. Entende que o vídeo prejudicou a campanha dela. O vídeo e a música são conforme original (vídeo publicitário postado por Déboora), mas houve um corte no vídeo de propaganda política, com inserção daquele. Disse que Jorge é “de Direita” ao seu ponto de vista, defende as questões de ser conservador, a favor da defesa da família, da pátria, vinculado a essas bandeiras políticas. Não sabe se o vídeo ainda está nas redes sociais de Débora. Soube após o vídeo de Jorge que o vídeo de Débora já existia.
MARIO GABRIEL DE MELLO DAL MOLIN disse que participou da campanha para majoritária no mesmo comitê do dela (de Débora). Estava com ela quando saiu o vídeo, ela recebeu uma ligação e foi até o declarante, falando que Jorge estava lhe difamando. Entrou no perfil de Jorge e assistiu ao vídeo, mas Débora não conseguiu terminar de assistir, e encheu o olho de lágrima. O vídeo era do bombeiro (candidato a vice-prefeito Cossetin), com a máquina de plantar a milho. Jorge fez um corte no vídeo e falou “agora vamos mostrar alguma coisa da concorrência”. E tinha um corte de uma festa que a Débora foi com uma roupa sensual, e ele repetindo, puta, puta, puta. O perfil de Jorge no insta era aberto. Depois da exclusão do vídeo, não o recebeu pelo Whats, mas em seu círculo de amigos se comentou bastante mesmo após o ocorrido. O vídeo original era para divulgação de uma festa local. Questionado, disse que a campanha de Débora estava bem satisfatória, mas após o vídeo Débora falava que sua campanha havia acabado. Sobre Jorge, disse que conhece pois é vereador na cidade e médico, mas nunca teve uma relação nem conversa. Seus parentes conhecem ele pela sua atuação clínica, acredita que Jorge seja da direita. O vídeo de Jorge não modificou o vídeo, e sim, realizou um corte, entendendo que os gestos utilizados foram obscenos. Em sua percepção, há um duplo sentido no vídeo (nos gestos feitos por Jorge ao final). Mostrado o vídeo completo postado nas redes, a testemunha disse que um dos gestos que Jorge fez no vídeo entende como algo maldoso, tendo duplo sentido. O perfil de Débora é público e acredita que o vídeo original ainda está nas redes sociais. Houve uma descontextualização do vídeo de Débora por Jorge, pois o que era para ser uma campanha publicitária de uma festa parou em um vídeo político.
SADY XAVIER DA CRUZ, ouvido como informante por ter feito campanha para Débora, disse que soube do vídeo de Jorge por sua filha (de Sady), pois não tem Instagram. O declarante havia pedido votos para Débora a seus familiares, e ao mostrar-lhe o vídeo, sua filha questionou de forma sarcástica sobre votar nela, “se era nela que o pai queria que votassem”. Disse que foram cortes feitos para a produção do vídeo, e que perdeu o voto das filhas para Débora após o vídeo. Falou com Débora sobre o vídeo depois das eleições. Começou a apoiar a candidata porque seu sobrinho que iria concorrer desistiu, então buscando um novo candidato para apoiar, optou por Débora. Não esperava que sua família desistisse de votar na candidata por causa do vídeo. Ficou sabendo que Débora foi parar no hospital e sabe que até hoje não está bem e está se tratando em razão do ocorrido. Conhece Jorge por ser Vereador e médico na cidade, sendo uma pessoa influente. Viu o vídeo completo de Jorge, onde começa a apresentação do partido pelo vice-prefeito. Não tinha conhecimento se esse vídeo (de Débora) já existia nas redes sociais antes da campanha eleitoral.
Ainda que o vídeo de Débora tenha sido postado por ela em suas redes sociais em abril de 2024 (muito antes de ser candidata, portanto), e não tenha sido adulterado pelo representado (quanto ao conteúdo e música), a sua descontextualização, repito, gerou grave desinformação, levando sua candidatura a descrédito e à derrota nas urnas.
As testemunhas arroladas pelo réu também tomaram conhecimento do vídeo, relatando acerca de sua conduta. Disse RÉGIS ALEX MATTIONI, técnico legislativo da Câmara de Vereadores de Ijuí, que viu as postagens depois que já havia dado a polêmica, por meio de um grupo de WhatsApp. Não sabe se o vídeo ainda estava postado ou já havia sido excluído. Não lembra quando viu o vídeo. Soube que foi deletado depois de Débora ter se manifestado. Percebeu a fala do Jorge ‘CRITICANDO” a fala do Béto Noronha dizendo que Débora estava preparada e aparecia esse vídeo que ela mesmo postou com uma música de fundo. Não segue a Débora nas redes sociais, mas foi pesquisar o Instagram dela depois da polêmica. Achou que quando ela fez a postagem, abriu espaço para interpretação. Não sabe qual a finalidade do vídeo original. Não sabia que ela era candidata a vereadora. Não tem conhecimento se o vídeo ainda está nas redes sociais de Débora. Não viu modificação na música entre os dois vídeos, não parecendo haver distorções. Disse que Jorge é uma pessoa de opinião forte, defendendo a linha de pensamento da direita, ele sempre se manifestou nesse sentido, na defesa dessa ideologia, mas nunca foi de desrespeitar as pessoas, sendo “forte de embate”, mas não de desrespeitar. Disse que ficou chocado com a postura de Débora, de postar um vídeo indevido na campanha, achando que o melhor seria retirar o vídeo do ar antes de se candidatar. Entendeu que não era a postura de alguém que estivesse fazendo campanha.
Veja-se que até mesmo a testemunha de defesa disse ter ficado chocada com Débora postar um vídeo indevido na campanha, a corroborar a afirmação de que a descontextualização gerou desinformação. Nesse sentido, veja-se o relato de Régis, arrolado pela defesa, ao referir que “ficou chocado com a postura de Débora, de postar um vídeo indevido na campanha, achando que o melhor seria retirar o vídeo do ar antes de se candidatar. Entendeu que não era a postura de alguém que estivesse fazendo campanha.”
BRUNA GUBIANI, que era vereadora por candidatura coletiva, e candidata à eleição para vereadora em 2024 (tendo renunciado antes de 29 de setembro), disse que soube do vídeo postado muito tempo depois, pois não acompanhou os debates. Recebeu o vídeo pelo WhatsApp. Em sua percepção, disse que se tratava de um vídeo com imagens públicas dentro de um contexto, de um debate político, de uma construção de propostas para o pleito dos vereadores do município, em que ambos estavam inseridos. Falou que o vídeo não lhe diz nada sobre ofensas, pois se tratou de um vídeo onde foi reproduzida uma imagem que já era pública e uma música. Disse não ter opinião sobre o que cada um veste ou posta em suas redes sociais. O assunto estava dentro de um debate público.
Não! O assunto não estava dentro de um debate político, não se tratava de um vídeo de construção de propostas no debate político, mas sim de um vídeo publicitário, que foi indevidamente veiculado pelo representado em um corte de um vídeo político, para desqualificar Débora.
Bruna elogiou a conduta de Jorge como vereador, dizendo que sua relação com ele sempre foi muto respeitosa, visualiza Jorge como sendo um político tradicional da direita, bolsonarista. Em vários momentos, teve embates públicos por questões ideológicas, de debate, mas sempre dentro do debate político, e que nunca foi desrespeitada ou ofendida. Jorge sempre foi um cara muito respeitoso com todo mundo dentro da câmara, houve momentos de interação entre grupos LGBTs e nunca houve falta de respeito. Conhece Débora e teve um contato com a mesma na época do DCE na faculdade, mas nunca visualizou ela como política. Acha um exagero dizer que o vídeo abalou a imagens dela a ponto de não elegê-la. Nunca olhou as redes sociais de Débora. Não identificou alteração de um vídeo para o outro, entende que Jorge repete a música ao final do vídeo. Não conhecia a música antes da audiência de hoje. Jorge tem influência política.
Por fim, dois outros vereadores prestaram depoimento. MARILDO KRONBAUER disse que viu o vídeo pelo Instagram um tempo depois. Mas viu os dois vídeos na “casa” porque os colegas de câmara comentavam. Recebeu o vídeo de Jorge pelo WhatsApp. Falou que “tem coisas que você vê e escuta”, mas não interfere. Não fez nem um tipo de comentário pois diz não caber a si falar. Jorge não se explicou e comentou nada na câmara. Acha que a postagem é dela, e que Jorge somente repetiu as palavras da música. Jorge é combativo nas questões sobre a direita, mas nas demais questões nunca faltou com o respeito com ninguém. Via Débora na Câmara, junto com Beto (que foi candidato a prefeito), mas não conhecia mais que isso. Jorge tem opinião forte na política, e deve ser uma liderança, “se não nem teria se eleito pela terceira vez”.
No mesmo sentido foi o relato de UBIRATAN Herthal, o qual disse que não viu os vídeos nas redes sociais, mas viu após por meio de notícias. O vídeo chegou em seu WhatsApp. Entendeu que Jorge falava do vídeo normal, acredita que ele só tenha repetido o que já havia no outro vídeo (de Débora). Não entende que o vídeo manchou a candidatura de Débora, acha que foi um debate político. Pelo que ouviu na Câmara, Jorge tirou o vídeo do ar. Participava da mesma coligação que Jorge. Viu Débora na câmara algumas vezes, e então a conheceu. Acredita que ela continuou fazendo campanha política após o ocorrido. Acredita que se você se expõe nas redes, corre o risco de ser mal interpretado. Em sua concepção, não faria um vídeo com os termos usados. Entende que Jorge somente repetiu a música, e que os embates de dele sempre são voltados para a Direita, havendo debates com o PT. Sabe que ele é engajado com os movimentos tradicionalistas.
Como se vê, o réu, que é vereador (agora em seu terceiro mandato), que já foi candidato a deputado estadual (o que lhe deu maior visibilidade), que é médico atuante na comunidade (ginecologista e obstetra), que circula pelos meios tradicionalistas, possuindo 12.000 seguidores no Instagram e quase 5.000 seguidores em cada um de seus perfis do Facebook (possui dois), é uma pessoa bem conhecida na comunidade, e abusou do poder político.
Não há como normalizar o agir do réu, pois evidente a violência política de gênero no caso, a qual pode ser caracterizada como todo e qualquer ato com o objetivo de excluir a mulher do espaço político, impedir ou restringir seu acesso ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade.
Veja-se que o réu usou vídeo publicitário de Débora, por ela produzido para divulgação de festa temática para o público LGBTQIA+, em que ela aparece com roupas sensuais, com a música Double Team, de Anitta, Bad Gyal e Brray, em que o refrão é “Soy bien puta y to’s lo saben, to’s lo saben, Soy piranha y todo’ lo saben, ah, to’s lo saben, Soy bien pu-pu-pu-pu-pu-pu-puta, puta, puta, puta”, e descontextualizou-o, veiculando logo após a sua apresentação política pelo candidato a prefeito da coligação integrada pelo partido a que concorria a vereadora. E ao final, o representado fez gestos cantando “pec, pec, pec” (que na oitiva de testemunhas a defesa disse que se referiam aos gestos feitos pelo candidato a vice-prefeito, plantando milho com uma pica-pau”), e “puta, puta, puta”, mexendo os braços, que foram entendidos como obcenos, de duplo sentido, como antes consignado por algumas testemunhas.
Não se trata de “fazer drama”. Ainda que o vídeo tenha sido produzido e veiculado por Débora, ainda que continue disponível em seu instagram, ainda que o endereço de instagram no qual veiculou tal vídeo seja o mesmo informado à Justiça Eleitoral no registro de candidatura, ainda que a música seja a originalmente veiculada no vídeo, tal não legitima a conduta deste.
De fato, a vida pessoal dela não lhe interessa, deve ser respeitada (ainda que se trate de pessoa pública, ou que almeje sê-la), e não a desqualifica para o cargo em disputa ou qualquer outro.
E mais, a violência política de gênero é um problema social, não de Débora. Essa violência é considerada uma das causas da sub-representação das mulheres na política, nos espaços de poder e decisão, e prejudica a democracia.
Não se tratou de mera crítica política, como alegado pelo representado, tendo ele ultrapassado os limites da liberdade de expressão.
O réu usou a forma mais comum de violência política de gênero, que é a desqualificação da candidata mulher, ou seja, indução à crença de que a mulher não possui competência para a função a que ela está se candidatando ou para ocupar o espaço público onde se apresenta.
O representado reconheceu que se excedeu, e tirou o vídeo do ar. No entanto, a campanha difamatória já estava lançada e espalhou-se, continuando a circular em grupos de whatsapp mesmo depois de aquele ter apagado a postagem, conforme mencionado por Débora e algumas testemunhas.
Por fim, não há como afirmar-se matematicamente que Débora seria eleita se não fosse o vídeo postado pelo representado, havendo relato de algumas testemunhas de que a candidatura “degringolou” após o ocorrido, tendo ela feito metade da votação que se esperava.
No entanto, não mais se exige a comprovação da potencialidade do ato abusivo, como em outras eleições, bastando, nos termos do art. 22, XVI, da LC 64/90, a “gravidade das circunstâncias que o caracterizam”, a ser aferida a partir de aspectos qualitativos e quantitativos do caso concreto” (REspEl nº 0600410–87/CE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 23.2.2023).
Nesse sentido:
Eleições 2016.[…] Abuso do Poder econômico. […] 3. Com o advento do inciso XVI do art. 22 da Lei Complementar 64/90, introduzido pela Lei Complementar 135/2010, elevou-se posicionamento jurisprudencial ao status de lei, passando-se, todavia, a não mais se estabelecer a exigência de potencialidade do ato abusivo, com estrito condicionamento da repercussão do fato ao resultado da eleição, atrelando-se a configuração do abuso de poder a requisito mais abrangente vinculado à gravidade das circunstâncias, com a finalidade de preservação do bem jurídico tutelado, qual seja, a normalidade e a legitimidade das eleições. […].”
(Ac. de 3/10/2019 nos ED-REspe n. 50120, rel. Min. Sergio Silveira Banhos.)
E no caso, a gravidade apta a violar o equilíbrio do pleito decorre da infringência, pelo representado, de legislação que visa a coibir a violência política de gênero, impondo-se a procedência da ação.
Por consequência, reconhecido o abuso de poder político e o uso indevido dos meios de comunicação pelo réu, impõe-se a cassação do diploma deste, a declaração de sua inelegibilidade pelo prazo de oito anos a contar da eleição de 2024, e a anulação dos votos por ele obtidos, inclusive para a legenda, com o recálculo do quociente eleitoral e partidário e a retotalização dos votos.
PELO EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE a ação de investigação judicial eleitoral proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL para:
a) cassar o diploma de vereador de JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA, por ter sido beneficiado pela prática de abuso de poder político e por utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da Lei Complementar Federal nº 64/90, c/c o artigo 14, § 9º, da Constituição Federal de 1988;
b) declarar a inelegibilidade de JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA pelo prazo de oito anos a contar da eleição, pela prática de abuso de poder político e por utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da Lei Complementar Federal nº 64/90, c/c o artigo 14, § 9º, da Constituição Federal de 1988, bem como por violação ao artigo 6º, §4º, da Res. TSE 23.735/2024 6; e
c) declarar a nulidade dos votos obtidos pelo réu, inclusive para a legenda, na forma do art. 222 do Código Eleitoral, com a determinação do recálculo do quociente eleitoral e partidário e a retotalização dos votos.
Intimem-se.
Havendo recurso, intime-se a parte contrária para contrarrazões e remeta-se ao e. TRE/RS, conforme art.22 da Resolução 23.608/19 do TSE.